sexta-feira, 20 de junho de 2014

Nós e a vida

Ao ler este post da Suricate, lembrei-me das complicações que toda a vida tive com o meu pai.
Talvez por ambos sermos escorpião e batermos de frente sempre tivemos uma coexistência difícil.
O meu pai foi emigrante durante muitos anos e as memórias que tenho é que passávamos um ano relativamente pacífico e nos 2 meses em que ele vinha de férias quase sempre havia discussões.
Quando veio de vez tinha eu cerca de 11 anos, foi difícil muito difícil. Nunca fui de ouvir e ficar calada e ele nunca gostou que o questionassem. As cenas quase sempre culpa de eu sair em defesa dos meus irmãos ou da minha mãe (sou a mais nova de 6) não eram bonitas de se ver.
Resumindo, não foi fácil. Amenizaram quando fui para a faculdade, mas havia sempre um rastilho de pólvora entre nós, uma palavra mal dita e podia levar a discussões feias.
Mas hoje olho para trás e penso. O meu pai cresceu sem amor. Saiu do país sozinho aos 33 anos sem saber ler nem escrever com 4 filhos pequenos. Nasceram mais 2, eu vim por engano com 10 anos de diferença do mais novo.
Aprendeu uma língua nova. Aprendeu a ler e a escrever sozinho. Orientou-se e permitiu-nos que não nos faltasse nada do que era essencial.
Deu carta e mota aos manos e a mim também.
Pagou-me o curso que fiz numa Universidade privada.
Se estava bem disposto podia até ser brincalhão. 
A 5 de março acordei com a minha irmã a dizer que ele estava com a face rígida e sem conseguir falar.
Nem pensei saltei da cama e levei-o ao hospital - AVC hemorrágico seguido de isquémico. Aguentou valente, outros não teriam resistido a um quanto mais a dois.
Ficou com sequelas, muitas para um homem que aos 80 anos ainda se levantava para ir para o campo todos os dias, que não tomava medicação nem tinha qualquer doença diagnosticada.
Custou!
Todos os dias em que esteve no hospital lá fui. Sempre a dar-lhe força a ele aos manos à mãe. Nunca em casa ninguém me viu chorar. Vinha para o trabalho e desabava (como agora). Movi montanhas para que ele tivesse o melhor acompanhamento possível.
Está numa UCCI de média duração, deixou de lutar, resignou-se.
E o que mais me custa é deixar que ele vá para um lar, não queria. Apesar de tudo não merecia, ninguém merece sofrer depois de uma vida de trabalho, de luta, de dificuldades.
Mas tenho a minha mãe, que fruto de tudo, e ela sim doente crónica há muitos anos, começa a ressentir-se e o coração a fraquejar. Há dias em que também ela tem vontade de baixar os braços e deixar-se ir.
E eu!?
Entro em pânico só de pensar em perdê-los e não seguro as lágrimas....


Imagem retirada de: www.rac.com.br

1 comentário:

  1. Há diferenças que não têm solução. Mas depois há as outras que o tempo ameniza, há nós que crecemos e percebemos coisas que na altura não viamos À nossa frente...enfim...

    Um dia eles foram fortes por e para ti...agora é a tua vez! Sim?!

    Jinhooooossss e muita coragem!

    ResponderEliminar